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OpiniĆ£o de Sara Saraiva, BiĆ³loga

EspĆ©cie de planta perene Ć© considerada pelos biĆ³logos uma ā€œraridade clĆ”ssica
Alfazema-do-mar estĆ” em risco de extinĆ§Ć£o no Cabo Raso

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Uma espĆ©cie do gĆ©nero Limonium, um grupo de plantas conhecidas como alfazemas-do-mar, estĆ” em risco de extinĆ§Ć£o no Cabo Raso, no concelho de Cascais, alertam investigadores do Instituto Superior de Agronomia (ISA) da Universidade de Lisboa, na sequĆŖncia dos estudos que tĆŖm feito na zona.

As populaƧƵes dessa espĆ©cie, Limonium multiflorum, sĆ³ existem na costa portuguesa, entre Cascais e a NazarĆ©. Trata-se de um endemismo lusitano que ocorre nas primeiras manchas de vegetaĆ§Ć£o das arribas costeiras. Resistentes a ambientes salinos, estas plantas perenes apresentam folhas que crescem, em forma de roseta, junto ao chĆ£o preferencialmente rochoso. A partir da Primavera exibem flores lilĆ”ceas, tornando a sua observaĆ§Ć£o mais fĆ”cil no terreno. A espĆ©cie possui populaƧƵes muito antigas com indivĆ­duos que podem atingir uma longevidade atĆ© 30 anos.

AlĆ©m disso, apresentam uma variabilidade genĆ©tica muito baixa, porque na maior parte das vezes se reproduzem assexuadamente. Ana Caperta, investigadora do Centro de Biologia Aplicada Ć  Agricultura do ISA, salienta outra particularidade desta espĆ©cie que contribui para a sua vulnerabilidade: ā€œAs plantas que conseguimos obter a partir das sementes recolhidas no local revelaram-se estĆ©reis do ponto de vista masculino.ā€ Mas na populaĆ§Ć£o ainda existem indivĆ­duos com reproduĆ§Ć£o sexuada. ā€œPor isso, ainda se poderia esperar que a variabilidade fosse restaurada desse modo, mas, sendo estĆ©ril do ponto de vista masculino, a variabilidade desta populaĆ§Ć£o estĆ” ainda mais comprometida.ā€

Este traƧo Ć© comum nĆ£o sĆ³ para esta populaĆ§Ć£o do Cabo Raso, com apenas cerca de 1000 indivĆ­duos, como tambĆ©m para as plantas de outros locais, nomeadamente na foz do rio Lizandro e em Peniche. Embora a populaĆ§Ć£o com o maior nĆŗmero de indivĆ­duos se encontre na zona de Cascais, a investigadora considera que esta populaĆ§Ć£o ā€œestĆ” muito fragmentada e trata-se, na realidade, de vĆ”rias subpopulaƧƵes da mesma espĆ©cieā€.

Para um artigo cientĆ­fico sobre as alfazemas-do-mar, publicado na revista AoB Plants, em Junho Ćŗltimo, a equipa voltou a estudar a populaĆ§Ć£o do Cabo Raso: uma vez que jĆ” era conhecida a genĆ©tica da espĆ©cie atravĆ©s de estudos anteriores, os investigadores consideraram entĆ£o importante perceber se a Limonium multiflorum estaria ameaƧada no local.

O objectivo inicial dos cientistas envolvidos neste projecto desde 2010, em parceria com os tĆ©cnicos do Parque Natural Sintra-Cascais e da empresa municipal Cascais Ambiente, foi conhecer as espĆ©cies da costa portuguesa do gĆ©nero Limonium, devido Ć s dificuldades existentes na identificaĆ§Ć£o de grupos muito prĆ³ximos. Ana Caperta conta que, quando iniciaram o trabalho, estavam ā€œinteressados em distinguir as diferenƧas entre grupos e clarificar taxonomicamente espĆ©cies ambĆ­guasā€. Para alĆ©m disso, este grupo de espĆ©cies tem muita importĆ¢ncia na orla costeira, ā€œuma vez que estĆ” altamente representado em toda a costa portuguesa, desde Caminha a Vila Real de Santo AntĆ³nioā€.

No trabalho de campo realizado para o Ćŗltimo artigo, os investigadores avaliaram as variĆ”veis ambientais favorĆ”veis Ć  presenƧa da espĆ©cie. No Cabo Raso, refere Ana Caperta, as principais ameaƧas sĆ£o ā€œas espĆ©cies exĆ³ticas invasoras e nĆ£o o pisoteio como pensĆ”vamosā€. Verificou-se neste estudo que a presenƧa de chorĆ£o-das-praias (Carpobrotus edulis), uma espĆ©cie originĆ”ria da Ɓfrica do Sul, suculenta e de crescimento rasteiro, impede a presenƧa de Limonium multiflorum.

O facto de algumas zonas com esta espĆ©cie de alfazema-do-mar serem usadas como local de estacionamento Ć© outra das ameaƧas observadas durante o trabalho de campo. Por esse motivo, os investigadores nĆ£o hesitam em afirmar, no artigo cientĆ­fico, que a Limonium multiflorum ā€œpode ser classificada como uma ā€˜raridade clĆ”ssicaā€™, uma vez que apresenta uma distribuiĆ§Ć£o geogrĆ”fica reduzida e uma especificidade restrita de habitat, com populaƧƵes consistentemente de tamanho reduzido e baixos nĆ­veis de diversidade genĆ©ticaā€.

Mas o que Ć© uma ā€œraridade clĆ”ssicaā€, neste caso para uma alfazema-do-mar? A classificaĆ§Ć£o de raridade foi proposta em 1981 pela norte-americana Deborah Rabinowitz (1947-1987), que identificou sete formas diferentes para as espĆ©cies de flora serem consideradas raras. Os sete tipos possĆ­veis de raridade resultam de uma anĆ”lise de trĆŖs variĆ”veis relativas Ć  sua distribuiĆ§Ć£o geogrĆ”fica (reduzida ou alargada), especificidade no uso do habitat (especialista ou generalista) e ao tamanho da populaĆ§Ć£o local (pequena ou grande). As espĆ©cies raras clĆ”ssicas revelam-se como uma das sete formas de raridade e sĆ£o as que reĆŗnem os trĆŖs nĆ­veis de categorias mais limitados ā€“ ou seja, tĆŖm uma distribuiĆ§Ć£o reduzida, estĆ£o especializadas num habitat e a sua populaĆ§Ć£o Ć© pequena, o que encaixa nesta espĆ©cie de alfazema-do-mar.

Publicado no PĆŗblico, 02-01-2015, http://www.publico.pt/ciencia/noticia/alfazemadomar-esta-em-risco-de-extincao-no-cabo-raso-1680844